Profissionais do sexo omitem área de atuação

Profissionais do sexo omitem área de atuação

Muitas prostitutas entram na profissão porque as mães também faziam programa

São 7  da manhã e Luana Pires*, 32 anos, prepara o mingau da filha, Manoela*, de 1 ano e 8 meses. Esse era o único horário disponível para que a profissional do sexo pudesse receber a reportagem de A TARDE, já que ela atende os clientes no horário comercial e as noites são dedicadas à criança.
Luana tem pressa. Faz tudo de forma rápida, apesar de se equilibrar bem no salto tamanho 12, de sapatos vermelhos. Ela me pergunta se posso dar o mingau à garota, enquanto termina de se arrumar. "Assim teremos mais tempo para conversar", justifica. Aceito.
Manoela é uma criança risonha. Ao me sentar à mesa para dar a mamadeira, percebo que não é só o mingau que faz parte do cotidiano da menina.
Em meio aos alimentos sobre a mesa também há algo que ela, mais tarde, talvez corra o risco de confundir com o leite em pó que devora com tanto gosto: um papelote de cocaína aberto. Além da droga, frutas, café, talheres e alguns brinquedos.
Passam-se 30 minutos entre o tempo em que a pequena bebe o mingau e adormece nos meus braços. É o intervalo necessário para que a mãe fique pronta e se transforme em Lolita.
O vestido preto, justo, e o decote evidenciam o corpo curvilíneo. Trata-se de uma mulher bonita, apesar do olhar cansado. Morena, com 1,65 m de altura, cabelos longos e bem tratados, boca grande. Ela retira a cocaína da mesa, coloca na bolsa e leva a filha para a cama.
Ao voltar, faz questão de dizer que a droga é necessária. "Sem ela, é difícil aguentar o rojão". Entre um cigarro e outro, conta que o pai de Manoela é um cliente  por quem se apaixonou. Ele é 20 anos mais velho e casado, mas há um problema. "Ele não me ama", lamenta.
Segundo a garota de programa, ele era o único com quem transava sem camisinha. "Tomava pílula, mas na época meu ciclo estava desregulado por conta de um problema hormonal. Não queria, mas acabei engravidando, e foi a melhor coisa que poderia acontecer na minha vida", resume.
Questionada se em algum momento pensou em abortar, responde de maneira taxativa: "Jamais! Sempre me cuidei para não engravidar, porque sou contra o aborto. Teria, mesmo sem saber quem é o pai", afirma.
A jovem diz que é formada em administração e vive bem. Cobra R$ 150 por programa, mas evita revelar a renda mensal. "Receio contar o valor e acabar estimulando muitas adolescentes que ainda não têm maturidade para decidir que profissão desejam seguir. Falar de dinheiro poderia incentivar a ideia de que a profissional do sexo ganha a vida de maneira fácil. Só nós sabemos o que passamos".
O pai de Manoela também ajuda financeiramente, embora não dê a Luana o amor que ela tanto deseja. "Pelo menos, é um bom pai para a minha filha".
Luana deixa escapar apenas que possui renda maior do que a de muitos médicos e advogados. Ao contrário da realidade da mãe dela - também profissional do sexo -, que com o dinheiro mensal mal pagava as refeições e atendia os clientes na casa em que moravam. "Eu ainda lembro do cheiro e do barulho de sexo no ambiente e do entra e sai de homem na casa".
Filha única, também era carregada para o bordel quando a mãe, duas vezes por semana, trabalhava lá. "Ficava escondida, brincando de boneca em um quarto dos fundos".
Aos 13 anos, antes mesmo de menstruar, foi iniciada no sexo por uma mulher. "Foi melhor assim. A mulher sempre é mais delicada. Foi menos traumático".
A mãe faleceu quando ela tinha 17 anos, mas não houve drama. "Estava na hora dela. Minha mãe fez por mim o que pôde, mesmo ela me obrigando a me prostituir".
A experiência de vender o corpo para homens e mulheres desconhecidos, no entanto, não é o que ela considera o pior na profissão.
O trauma que carrega é muito anterior à primeira experiência sexual. "Eu ainda era pequena e, na escola, meus colegas gritavam quando eu passava: lá vai a filha da p.... Eu era e sempre fui a filha da mulher a quem todos chamavam de vadia". Esse é o motivo que a leva a esconder o nome e o rosto nessa reportagem.
"Não quero que a minha filha passe por isso. Ela não será uma filha da p... como eu fui. Ela é filha de Luana Pires. Terá a melhor comida, frequentará a melhor escola, a melhor universidade. Terá orgulho de mim".
Pergunto se tem orgulho de si mesma. "Claro que sim. Tenho uma filha linda. Ganho dinheiro sem roubar e sem prejudicar ninguém. Sou honesta e mereço respeito", diz, mostrando que, ao contrário da personagem da canção Geni e o Zepelim (Chico Buarque), ela não foi feita para apanhar e nem é boa de cuspir.
Esta Geni deixa claro que não é maldita e que, definitivamente, não permite que lhe atirem pedras.
*Nomes fictícios

Categoria evita declarar atividade

É difícil estimar o número de profissionais do sexo atualmente no País. Nem dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) correspondem à realidade, sobretudo porque muitas mulheres e homens não declaram fazer parte desta categoria profissional que, segundo historiadores, existe desde os primórdios da humanidade. Há registros de mulheres que se prostituem desde a Grécia antiga.
O tempo passou, mas o preconceito ainda é grande. Não por acaso, apenas 2.648 mulheres e 801 homens afirmaram aos pesquisadores ser profissionais do sexo no Censo 2010. Na Bahia, apenas 102 mulheres, 81 delas residentes da capital.
Os dados sobre o número de profissionais do sexo com filhos também não é seguro. Das 2.648, 1.506 declararam ser mães (de filhos vivos), embora não haja informação sobre o percentual dos que seguem a profissão.

Fonte:Atarde

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